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15dez 2016

A equiparação do comprador de lote ao condômino à luz do Decreto Lei 271/67 e suas repercussões

O Código Civil de 2002, no Capítulo VII, Título III, do Livro III revogou a Lei Federal nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, naquilo que regulamentava o chamado condomínio edilício. Esta lei vigorou por mais de trinta e nove anos, se considerarmos a entrada em vigor da norma revogadora, o Código Civil de 2002, com vigência a partir de 11 de janeiro de 2003 (vacatio legis de um ano). A rigor, o termo condomínio, em sentido amplo, diz respeito à compropriedade, ou seja, a coexistência de mais de um proprietário sobre o mesmo bem. O Código Civil inaugurou o tratamento topológico especial do Condomínio, no Capítulo VI, do Título III, do Livro III, do Código Civil, referindo-se a direitos e deveres dos Condôminos, administração do condomínio, distinguindo o condomínio voluntário do necessário, de acordo com a causa. Sendo causa contratual, o condomínio será voluntário. Quando o condomínio se dá por fato jurídico, a exemplo da sucessão, ou pela lei, a exemplo dos muros, diz ser necessário. A classificação do condomínio não é tema deste artigo, que objetiva, apenas, dar notícia de norma que equipara o promissário comprador ao condômino, conforme vem sendo sedimentado nos tribunais pátrios.

O contexto do Empreendimento Alphaville Lagoa dos Ingleses não deixa a menor dúvida da existência de um pacto de convivência e coexistência de propriedades imobiliárias em área de loteamento fechado, sob governança de um novelo associativo. A situação é aparentemente paradoxal, vez que as vias públicas e logradouros em geral, além da área afetada pelo próprio empreendedor como área verde, nos termos da Lei 6.766/79, não se projetam na propriedade individualmente considerada, mas sim no todo do empreendimento.

Na trilha da maximização do bem estar, surgem as possibilidades de atuação complementar do particular aos serviços genuinamente públicos, como é o caso da segurança. Daí a criação de uma nova figura, na contemporaneidade, denominada “condomínio de fato”, expressão que vem sendo usada para designar a situação em que as vias e espaços livres pertencentes ao poder público ou ao empreendedor, mas vinculada ao empreendimento no todo, coexiste à propriedade isolada, com assentos registrais sem menção à projeção de tais acervos à respectiva unidade autônoma, sob aspecto dominial apenas. Se de um lado o domínio apenas se restringe à área da unidade, de outro, os direitos do proprietário se estendem ao modelo utilizado na aprovação do loteamento, fazendo parte integrante, como espécie de acessório indissociável, ou seja, o proprietário de lote passa a ser co-titular de um direito acessório à propriedade.

É importante esclarecer que o loteamento fechado (“condomínio de fato”) é figura contemplada na Lei Federal nº 6.766/79 e vem surgindo como uma nova realidade em nosso país. O loteamento fechado apresenta-se normalmente como uma estrutura de um condomínio horizontal, cercado, murado, com vigilância contínua e portaria que restringe o acesso livre de pessoas. Após o registro, o Município autoriza o fechamento das vias de comunicação, concedendo o direito real de uso de todas as áreas públicas com exclusividade aos moradores do loteamento.

Não obstante o Código Civil não traga tópico específico para o Condomínio de fato (nem mesmo exista legislação que trate da matéria), aplica-se a este o que dispõem os artigos 1.314 a 1.358 do referido diploma legal. O Enunciado 89, da I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, assim dispôs: “Art. 1.331: O disposto nos arts. 1.331 a 1.358 do novo Código Civil aplica-se, no que couber, aos condomínios assemelhados, tais como loteamentos fechados, multipropriedades imobiliárias e clubes de campo.”

O decreto-lei 271/67, que dispõe sobre o loteamento urbano, trata em seu artigo 3º da equiparação, em condições e benefícios, do comprador de lote ao condômino. Isto vai ao encontro do entendimento da Jornada de Direito Civil, que entendeu que as regras do Código Civil são aplicadas aos loteamentos fechados. O decreto, ao equiparar o condômino ao adquirente de lote, atraiu para esse as regras do Código Civil de 2002, que substituíram aquelas da Lei 4.591, de 16 de dezembro de 1964, que dispunham sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias. Tendo o Código Civil de 2002 tratado de condomínio, por óbvio, atraiu para si os efeitos da norma do decreto-lei (art.3º), apesar da menção à lei 4.591/64.

Equiparar situações, no plano normativo, não significa subtrair identidade de cada tipo, conceito, instituto ou instituição considerados isoladamente, mas estender efeitos, de forma a dar sincronismo anatômico e lógica. O que importa destacar é que prevalecem os contornos individuais de cada ente, conceito ou tipo, modificando-se apenas alguns efeitos a que se sujeitam. Ao se equiparar o promissário comprador de unidade em loteamento fechado ao condômino, subsistem as peculiaridades de cada um, no contexto ao qual se insere, podendo aquele se vincular às regras restritivas ou de convivência diferentes daquelas aplicáveis ao condômino de condomínio edilício, por exemplo, atendendo a necessidade de cada situação concreta. Assim, ao se equiparar o proprietário que adquire imóvel dentro de loteamento fechado ao condômino, não se cria figura híbrida, mas sim tratamento especial, como vem sendo sedimentado na doutrina e na jurisprudência consentâneas.

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